Faz tempo que não posto nenhum texto aqui no LinkedIn. Às vésperas de concluir a última edição da ProjetoPack em Revista, de suar a camisa em um ano árduo como nenhum outro “na história desse país”, resolvi botar algo aqui para os amigos que me seguem. Uma pequena fábula sobre como ferrar com as coisas, adotando uma postura imediatista, simplista e com “espírito de commodity”. Espero que gostem (é pro nosso setor gráfico, de embalagens e rótulos, mas acho que serve, no fim, como alegoria pra todos os demais).
Um consumidor hipotético para diante de uma gondola de supermercado. Ele olha para a prateleira e esquadrinha as diferentes embalagens de papel higiênico. Uma delas, muito chamativa e a seu gosto (bem impressa, por sinal), parece ser a escolha óbvia. Para não ter que voltar tão cedo à compra do item em questão, ele pensa que seria melhor comprar um pacote com o maior número de rolos possível.
Ao verificar o preço na etiqueta, acha caro. A opção pelo produto cai de 24 para 12 rolos, de 12 para 8, de 8 para 4 e, por fim, para uma outra marca – a mais barata disponível.
Na mesma semana, um comprador hipotético em uma indústria convertedora (também hipotética) com impressão flexográfica, sentado numa cadeira de estofado puído, recebe um vendedor de clicheria.
Após uma rápida troca de cartões de visita, o vendedor desata a falar sobre as mais recentes tecnologias de software e hardware – ponto plano, retícula de superfície, aprovação remota, prova digital calibrada etc. – existentes e disponíveis aos clientes de sua clicheria, bem como os ganhos de qualidade e produtividade que poderiam ser obtidos dada a sua adoção.
O comprador ouve tudo com certa indiferença e pergunta qual o preço do centímetro quadrado.
“Quero o mais barato”, afirma resoluto.
Mais alguns dias depois, um dono de marca hipotético está visitando a convertedora do parágrafo anterior, para discutir um novo projeto de embalagem. Atendido com toda a pompa e circunstância pelo gerente de vendas, representante comercial e pelo próprio dono, o dono de marca ouve um longo e detalhado discurso acerca da estrutura bem montada, da ISO 9000, do sofisticado laboratório de qualidade, da impressora flexográfica importada de última geração, das boas práticas de fabricação, da produção enxuta, do estoque de matérias-primas e de produto acabado e “senta que lá vem história”. Numa pausa mais longa, ele pergunta: “quanto vai me custar o quilo do material? Se for mais do que os R$ 12,00 que pago atualmente, fica inviável”.
No fim de mais um mês, numa sala bonita, de estilo minimalista, estão reunidos executivos hipotéticos de marketing e vendas de um tal dono de marca já citado. A reunião começa com uma apresentação powerpoint cheia de termos e jargões do marketing, seguidos de diversos slides com gráficos. Mesmo para um leigo, era fácil perceber, tanto pelas vozes exaltadas quando pelas linhas declinantes nos gráficos, de que havia um sério problema de metas não atingidas na empresa.
Em meio a uma profusão de desculpas e conjecturas, uma delas parecia repetir-se com maior contundência: “um tal consumidor hipotético teimava em não comprar aquele produto tão formidavelmente estudado, desenvolvido, fabricado e promovido; ele acabava preferindo levar uma tal marca C ou D, movido por uma escolha essencialmente ligada ao preço”.
Epílogo: um belo dia, um impressor flexográfico experiente, de boa formação acorda bem cedo. Toma um banho, escova os dentes e faz suas necessidades fisiológicas, concluindo o asseio com um papel higiênico de quinta categoria.
Chega ao trabalho e recebe a infeliz notícia de que ele e alguns dos seus colegas mais antigos da casa estão sendo desligados, substituídos por alguns ajudantes recém contratados, de pouca ou nenhuma experiência ou formação, mas que mesmo “capengando”, aperta os botões e deixa uma certa impressora flexográfica importada de última geração rodando (em baixa velocidade e com qualidade questionável, sem dúvida). Parece que o chefe dele escolheu a mão-de-obra mais barata disponível…
Até breve,
Aislan Baer