Chegamos enfim ao último artigo que aborda seis possíveis soluções para este ano difícil, que também brevemente se encerrará.
Nenhuma destas soluções é uma panaceia universal, mas têm grande potencial de mudar o estado das coisas, desde que aplicadas com seriedade e afinco: o foco no aumento da produtividade no chão de fábrica, o aperfeiçoamento técnico do setor de compras, a melhora em qualidade e agilidade na tomada de decisão e a inovação como epicentro do negócio. Findaremos, portanto, com a sustentabilidade como um diferencial estratégico, e trataremos disso adiante.
Há algumas semanas, o Egito sediou a Conferência das Partes das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas 27 – a “COP27”. Lideranças de todo o mundo usaram aproximadamente 400 jatinhos particulares para ir ao evento que discute boas práticas (e regulamentação) ambientais. A conferência também causou controvérsia ao ser patrocinada pela Coca-Cola, considerada a maior poluidora de plástico do mundo.
Ainda este ano, a Tesla foi removida pela agência S&P (Standard & Poors) de seu índice ESG (Environmental, Social and Governance) em virtude de uma suposta “falta de estratégia de redução do Carbono”. A Tesla é atualmente o maior fabricante e desenvolvedor de carros elétricos do mundo e tecnologias para acumulação de energia, um verdadeiro catalisador no âmbito do emprego de energia limpa em diversos setores da indústria. A ExxonMobil, do setor de petróleo e gás, no entanto, configura como centésimo nome das “Top empresas ESG” da S&P.
Também este ano a BlackRock, maior gestora de ativos do mundo (no primeiro trimestre deste ano, a empresa administrou USD 9,57 trilhões em ativos) optou por liquidar um fundo multi estratégia ESG (BSF Style Advantage Screened Fund), em virtude da falta de interesse por parte dos investidores e uma performance pífia (o fundo era composto apenas por empresas que compactuam com os objetivos sustentáveis da Agenda 2030 das Nações Unidas).
O prejuízo total anualizado em dólares foi de -17,5%, enquanto fundos de porte e composição equivalente fora das diretrizes ESG registraram ganhos na ordem de 7,5% no mesmo período de análise. Após o encerramento do fundo, os recursos foram realocados em fundos ditos “convencionais”.
Em resumo e como tudo na vida, por trás de um tema nobre há sempre hipocrisia e oportunismo. A mercantilização da ecologia dá margem às práticas de greenwashing – termo que, de acordo com a Wikipedia, define-se por “injustificada apropriação de virtudes ambientalistas por parte de organizações ou pessoas, mediante o uso de técnicas de marketing e relações públicas, com o objetivo de criar uma imagem positiva diante da opinião pública, acerca do grau de responsabilidade ambiental destas organizações ou pessoas”.
O nosso ponto de vista é que quando focamos na cultura e nos hábitos que podem se originar de um pensamento ambientalmente responsável constituir-se-ão nos maiores e mais perenes ganhos às empresas que os adotarem.
Explico com uma analogia da indústria. Quando comecei na consultoria, há aproximadamente 20 anos, era bastante cético sobre a metodologia / filosofia japonesa 5S (a aplicação dos cinco princípios ou práticas para limpeza, organização, separação, padronização e melhoria contínua). Honestamente, pensava que era algo para que consultores mal-intencionados ganhassem dinheiro de forma fácil e rápida, totalmente desnecessário. Ledo engano (embora sim, como disse há oportunistas em tudo).
O grande e real legado de uma implantação de 5S em uma organização é a disciplina. Quem não é capaz de arrumar a própria cama, não é capaz de salvar o mundo. E quem não é capaz de manter a sua área de trabalho minimamente organizada, não terá a disciplina basilar para pôr em prática outras ferramentas mais sofisticadas da Produção Enxuta.
O mesmo, ao nosso ver, se dará com a adoção dos conceitos chave da sustentabilidade. Dentre eles, o mais elementar de todos – o de que recursos são escassos e devem ser preservados. Uma cultura organizacional que prioriza o uso racional dos recursos – desde a matéria-prima, energia e utilidades necessárias ao funcionamento das operações, quanto da “energia humana” despendida para gerenciar processos e rotinas – é a base para combater o desperdício e preservar as margens imprescindíveis à perpetuidade do negócio.
Imbuídos desta cultura do uso racional dos recursos, as empresas passam a ser mais questionadoras de si próprias sobre o “fazer muito bem o que não precisaria ser feito”, abrindo espaço para as atividades que criam valor real aos clientes e à marca. A abundância de recursos conduz invariavelmente ao afrouxamento da gestão.
Outro ganho provável ao se colocar a sustentabilidade na estratégia é o entendimento de que soluções efetivas aos problemas – sejam eles milenares e complexos como o do descarte e reuso do lixo ou “triviais” como atingir as metas de uma organização – requerem obrigatoriamente uma visão multi disciplinar. A economia verde mostra isso todos os dias e a própria sigla ESG nos diz que um mesmo problema do mau uso de recursos têm implicações sociais, ambientais e governamentais (responsabilidade e prestação de contas).
Por fim e não menos importante no corolário da sustentabilidade está o papel da educação. Nenhum problema na história humana pode se resolver em definitivo com imposições legais ou, no sentido oposto, com incentivos econômicos. É preciso entender o cerne do problema, o motivo de se estar tratando a situação como um problema e discutir as proposituras de uma forma técnica e crítica (isto é, combatendo vieses). Em suma, é preciso educar.
Mudanças comportamentais de qualquer natureza, principalmente da magnitude como a que o mundo almeja conseguir para que não haja consumo desenfreado, que governos e empresários ponderem e balanceiem interesses pessoais e interesse coletivo, que pessoas comuns como eu e você vivam suas vidas pensando em gerações que ainda sequer nasceram (mesmo em meio às contas a pagar de hoje) só poderão ocorrer concomitante a uma ação educacional sistêmica, abrangente e eficaz.
Ser sustentável não se trata de ler e obedecer a um adesivo colado na parede com a frase “Ao sair, apague a luz’. Se trata de assimilar o porquê de se combater com afinco o desperdício, num mundo de escassez, iniquidades e constantemente à beira do colapso.
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